Primeiro dia
10:42
Sete da manhã e ela caminha
sozinha pela Rua Vergueiro. Algo intriga todos que por ela passam. Talvez seja
a meia calça preta com furos discretos e o modo que o cabelo castanho e liso
bate em suas costas espalhando as mechas pelo capuz do sobretudo vermelho. Ou
ainda as olheiras que nada interferem no seu olhar sonhador e despreocupado que
cruza com outro em uma esquina. Eles andam lado a lado em silencio, não é o
primeiro encontro deles. Então a expressão serena desaparece de seu rosto e ela
afirma não acreditar no amor. Ele sorri e diz que não acredita nela, apesar de
saber, bem no fundo, que é o culpado por isso. Quem diria que ela iria se
lembrar da frase dita por ele meses atrás? De fato, a garota tinha boa memoria.
Ele sabia que tinha que consertar
isso. Não para se sentir melhor ou para não ter que lidar com os olhares de
desprezo. Mas porque o coração dela tinha sido destroçado e a culpa era
estritamente dele. Então, após alguns
passos, ele tenta segurar a mão dela. Tentativa falha, já que ela se
desvencilha e observa as unhas pintadas de azul, fingindo não perceber que ele
estava ao seu lado.
Mas a verdade é que ela só esta
cansada de tudo. Principalmente de não admitir o que sentia. Ela se apoia na
grade e olha para baixo, observando os carros que passam na 23 de maio. Fecha
os olhos e deixa o vento bater no seu rosto. Ela sabe da gravidade do que
estava acontecendo não só na sua vida como também naquele momento, mas se deu o
direito de rir. Quem passa por ali jura que os dois formam o casal perfeito: o
garoto bonito em silencio ao lado da garota que gargalhava sem motivos
aparentes. Um é o ponto de equilíbrio do outro. Eles só precisam saber disso.
Ela coloca as mãos no bolso do sobretudo
e volta a caminhar distraída. Não há perigo dele querer repetir o gesto. E lá
esta ela, reprimindo seus sentimentos mais uma vez.
Ele não faz a mínima ideia do
lugar para o qual ela esta indo e muito menos se lembra do que estava fazendo antes de encontra-la, só quer ter a certeza de que irá aproveitar a
chance que o universo lhe deu nessa manhã de outubro.
E em uma rajada de vento ela
acerta o cabelo, enquanto algo entra no olho dele. Ela assopra e os dois riem
de como estão sendo bobos.
Esperando para atravessar, ele observa a mão dela balançando inquietamente. E então realmente se dá conta
do tamanho do erro que havia cometido. Ele sentia falta das mensagens de
madrugada, do modo que os olhos dela fechavam na luz do sol, de dobrar as unhas
dela e se preocupar se ela realmente estava bem. Ela era única, ela valia todos
os esforços. Por que diabos ele a tinha deixado partir?
Enquanto atravessavam, ele
segurou a mão dela. Eles sorriram um para outro, nenhuma palavra era
necessária. Porque ali, bem no meio da avenida, eles chegaram ao seu destino.
2 comentários
Me deu uma nostalgia, quando você falou Vergueiro :(
ResponderExcluirPra mim tambem tem um significado enorme :s
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